Pular para o conteúdo principal
Explorando Mundos - Representação

Rosemiro A. Sefstrom
Filósofo Clínico
Criciúma/SC


No artigo anterior exploramos o mundo como coerção, que é o mundo enquanto ferramenta de enquadramento do ser. E não é de se assustar ao saber que a maior parte das pessoas de que se tem notícia veem a realidade desta maneira. Neste artigo veremos o mundo como representação, onde a questão se torna muito mais difícil, uma vez que o que se apresenta no mundo enquanto representação é fácil de entender e ensinar, mas difícil de viver.

O exercício que se dá deste ponto em diante é o de levar a compreensão de dois princípios básicos da Filosofia Clínica. O primeiro destes princípios vem de um filósofo chamado Protágoras, o qual diz: "O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são." O segundo filósofo chama-se Schopenhauer e disse: “O mundo é minha representação”.

Antes de avançar em direção ao que cada filósofo disse e a interação disso com o que se vive nos dias atuais é interessante retomar o ponto central, ou seja, o mundo. Imagine-se Sentado em um banco no cafezinho às cinco e meia da tarde, vendo as pessoas passarem. Ao seu lado, ouve-se um homem de longa data, com voz rouca e compassada dizer: “Este lugar é muito movimentado, pessoas que entram e saem sem parar.

Lembro quando sentávamos no banco da praça e podíamos contar as pessoas que passavam em uma hora”. Um rapaz, neto deste senhor diz: “Vô, o senhor acha isso movimentado porque não conhece São Paulo, Nova Iorque, lá sim é muito movimentado, pessoas indo e vindo rapidamente”.

Os que ouvem a discussão atribuem razão ao mais jovem, provavelmente pelo que já viram na televisão ou leram em jornais, mas quem está certo? Nenhum dos dois, tanto o jovem neto, quanto o avô sabem do que estão falando e o falam de acordo com o mundo que têm para si. Talvez um dia esse avô conheça São Paulo ou Nova Iorque e então diga: “Não sabia que o lugar onde vivo é ainda tão calmo”.

Quando o filósofo Protágoras diz que “o homem é a medida de todas as coisas”, ele está colocando que a medida de grande e pequeno, leve e pesado e até mesmo certo e errado não podem vir de fora. Quando o neto ouve a história do avô e diz que aquele lugar é calmo se comparado aos grandes centros mundiais ele o está fazendo pela medida dele.

Pois é ele quem conhece estes centros e pode comparar ao que vê naquele momento, mas como teria o avô como medir coisas que não conhece? Como um pai pode medir a dificuldade dos estudos da faculdade de um filho se não está lá no lugar dele? Piorando ainda mais, mesmo que vá ao banco da escola, será ele que está lá e não o filho.

Neste caso se o filho diz que está difícil, temos de conhecer a medida dele e só assim poderemos determinar se realmente está difícil. A medida de cada coisa da sua vida é você, não há como dizer se é fácil ou difícil o que você está passando sem conhecer como é para você.

O outro filósofo completa esta máxima dizendo que “o mundo é minha representação”, então, se aquele lugar é movimentado para o avô, assim o é para ele. E, se o lugar não é movimentado para o neto, assim o é para ele. A maneira como cada um representa aquele lugar onde está é diferente e por isso querer dizer que um está certo e outro errado é praticamente absurdo. Usando um termo simples, pode-se dizer que o que é calor para uma pessoa é calor para ela, não quer dizer que seja calor para outra pessoa. Não tenho como provar para a pessoa que não está calor simplesmente porque não está calor para mim.

Não é fácil aceitar que a medida da felicidade, da satisfação é o outro, pois muitas vezes nos é ensinado que existe um padrão e que estar neste padrão é ser normal. Muito mais difícil é entender que, quando o seu filho diz que você não foi um bom pai ou uma boa mãe isso é assim para ele. Que mesmo você dando seu sangue a ele até hoje, ainda assim ele não se sente amado, não é fácil aceitar que isso não é culpa sua. Não é você que não lhe deu amor, ele é que não consegue receber o que você tem para dar. É fácil entender que cada um é a própria medida e que representação de mundo é única, mas muito difícil aceitar e conviver com isso.

Comentários

Visitas