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Mauro melhora sufocando

Lúcio Packter
Pensador da Filosofia Clínica


Durante algum tempo as aulas de Filosofia Clínica aconteceram na Universidade Federal do Piauí, em Teresina. Em um pátio cercado de bambuzais, atendi a muitas pessoas em um período de aproximadamente dois anos. Mauro veio à consulta trazendo um livro que recomendava o diálogo, a expressão livre dos sentimentos, sobretudo dos medos, o abrir-se ao outro como maneira de aliviar sintomas e em alguns casos as questões mais profundas.

Para ele, isso não o livrava da asfixia. Isso o asfixiava. Sua historicidade era pontuada de explanações, conformações que mostravam que para ele as coisas não poderiam funcionar de outro modo.

Não são poucas as pessoas que quando têm questões existenciais conflitantes costumam fazer um recolhimento; lambem suas feridas, cicatrizam alguns ferimentos, procedem em silêncio, longe das conversações, próximas aos monólogos. Somente após uma melhora subjetiva elas conseguem retomar o diálogo. De certo modo, o diálogo é contra-indicado a pessoas como Mauro em mais de uma vez.

Achar que uma conversa carinhosa, repleta de compreensão, é o caminho indicado pode levar a enganos dolorosos. Quem propõe a conversação pensa estar ajudando; quem é como Mauro pode estar experimentando o mesmo que aconteceu em Crime e Castigo, de Dostoievski. O pobre Raskolnikov em suas conversas com o comissário de polícia vai arruinando seu próprio equilíbrio.

“Eu costumo melhorar sufocando as minhas coisas” - falou Mauro. E no caso dele isso não se tratava de um sintoma.

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