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Menos face, mais look*


Mensagem recebida pelo Facebook: “Fiquei feliz em te ver no restaurante. Estás muito bem!”

Resposta ao amigo: “Querido Carlos, por que não vieste conversar comigo? Somos amigos e eu também ficaria muito feliz em te rever, trocar um abraço e algumas palavras. Dá próxima vez, deixa de lado o computador, a  rede social e senta comigo. Vai ser mais divertido.”

Estamos sendo dominados e virando prisioneiros da tecnologia que nós mesmos criamos. Só que a prisão não é uma cela pequena e escura onde ficamos isolados. Pelo contrário, é uma tela que nos oferece um  universo sem fronteiras, repleto de distrações e amigos virtuais. Podemos com um pequeno computador realizar mil atividades diferentes e concomitantes. Mandar e receber e-mails, mensagens, torpedos, assistir televisão, ver filmes, realizar buscas, namorar, fazer sexo, conectar com pessoas do mundo inteiro.

Entretanto, apesar da suposta liberdade, a pena é a mesma: Isolamento em uma vida pequena, trancada na solidão de uma telinha e amarrada a uma rede social virtual que prefere mostrar fotos e não emoções,  conversa horas sem contato visual, curte sem ao menos ler o que está escrito, cruza por você na rua e nem lhe cumprimenta.  Criamos telefones inteligentes e nos tornamos burros.

Ao abrir o computador, fechamos as portas de nossas vidas e passamos a apreciar a dos outros, que editam e exageram seus momentos em uma rede de auto promoção e felicidade continua.  Por que tudo isto? Quando começou esta tendência?

Talvez no momento em que a felicidade passou a ser uma obrigação pessoal. Ninguém mais tem o direito de se sentir infeliz, isso é considerado uma incompetência social. Ninguém quer se sentir ou ser visto como melancólico.  A necessidade de estar e se mostrar sempre feliz em comemorações, baladas, viagens, restaurantes, está produzindo depressivos e ao mesmo tempo excluindo-os.

Para escapar deste mal, procura-se freneticamente tapar os prováveis buracos de uma vida vazia e sem sentido espiando a vida dos outros ou se auto promovendo. É um ciclo sem saída, quanto mais desperdiçamos o tempo nas redes, menos nos sobra para viver e mais dependentes ficamos de postagens nas redes sociais.

Perceberam como dizer “te amo” pela internet é fácil? Ficou banalizado dizer que se ama. Basta digitar, apertar um botão e enviar. É preciso amar as pessoas como se não houvesse internet, ferramenta que aparentemente aproxima, mas na verdade é um abismo emocional. Conecta, mas à distância. Junta, mas nem tanto. Ama, mas não sente.

Era uma vez um casal que não tinha internet. Ele vendeu seu computador e comprou um par de alianças. Ao invés de curtir postagens, amavam-se. Não precisavam dizer para centenas de pessoas o que fizeram, compartilhavam entre si. Tinham um velho computador, mas o utilizavam como livro, e não como um amigo. Sobrava tempo para abraços, sorrisos, calor dos corpos, brilho no olhar, toque de pele, pulsar dos corações. Estavam “on line” para amar. Não sei se viveram felizes para sempre, mas se curtiram um monte.

Será que estamos buscando alguma coisa nos outros por estarmos carentes de nossas próprias emoções? A vida é feita de desafios, um deles é se desligar do computador e se ligar nas pessoas, na vida e em nós mesmos. Quer ser meu amigo? O mínimo que espero é um abraço apertado.

*Ildo Meyer
Médico, escritor, palestrante, filósofo clínico
Porto Alegre/RS 

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