Eu nunca guardei
rebanhos,
Mas é como se os
guardasse.
Minha alma é como um
pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das
Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza
sem gente
Vem sentar-se a meu
lado.
Mas eu fico triste como
um pôr de sol
Para a nossa
imaginação,
Quando esfria no fundo
da planície
E se sente a noite
entrada
Como uma borboleta pela
janela.
Mas a minha tristeza é
sossego
Porque é natural e
justa
E é o que deve estar na
alma
Quando já pensa que
existe
E as mãos colhem flores
sem ela dar por isso.
Como um ruído de
chocalhos
Para além da curva da
estrada,
Os meus pensamentos são
contentes.
Só tenho pena de saber
que eles são contentes,
Porque, se o não
soubesse,
Em vez de serem
contentes e tristes,
Seriam alegres e
contentes.
Pensar incomoda como
andar à chuva
Quando o vento cresce e
parece que chove mais.
Não tenho ambições nem
desejos
Ser poeta não é uma
ambição minha
É a minha maneira de
estar sozinho.
E se desejo às vezes
Por imaginar, ser
cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado
por toda a encosta
A ser muita cousa feliz
ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que
escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem
passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio
pela erva fora.
*Fernando Pessoas
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