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Espiritualidade para Poetas*




“Escritor: não somente uma certa maneira especial de ver as coisas, senão também uma impossibilidade de as ver de qualquer outra maneira” (Carlos Drummond de Andrade).

A cada manhã renasço com as esperanças que florescem anônimas no jardim dos meus dias. A beleza não precisa de propaganda quando a plateia que contempla sua delicadeza oferece aplausos com as sutilezas do olhar. Em cada canto de minha casa está um pouco daquilo que sou. Na cozinha os aromas do tempo e o perfume dos mais variados temperos costuram nas tramas da vida o presente do passado. Sobrevivo de memórias que a cada dia são sempre novas. Carrego em minha alma as marcas do tempo da vida bem vivida. E por vezes sofrida…

Na minha pequena biblioteca os amigos das noites infinitas de solidão. Nunca obtive o autografo de um autor famoso, mais conheço a alma de cada um deles melhor que os seus amigos de outros tempos. Minha história tem um pouco de Guimarães e de Drummond. Meus sonhos se confundem com os de Pessoa e minhas lágrimas são um pouco de Graciliano. Em cada canto de minha alma encontra-se um sorriso nas entrelinhas das marcas eternizadas em parágrafos que me ajudaram a escrever meus dias.

Na estante alguns bibelôs que marcam minhas viagens por tantos lugares que hoje são apenas doces lembranças que o tempo não quis esquecer. Caminhei pela vida buscando belos horizontes e portos alegres. Perdi-me em muitos passos e cheguei há alguns portos seguros. Sou da vida viajante que escreveu no tempo pequenas histórias que somente eu mesmo conheço.

Em cada tarde ritualizo antigas práticas que em mim se faz sacramento de valores que o tempo não apaga. Despeço-me do sol e acolho as alegrias da noite que em estrelas fulgurantes devolvem-me saudades de um sertão com muitas veredas. Sou filho da poesia e dos amores que em mim ainda despertam o desejo incontido que me fazem seguir nos caminhos sempre novos a cada amanhecer.

Prefiro calar-me e ver a vida com os olhares que me devolvem a paz roubada pelas agitações modernas. Sou de outros tempos nos quais a vida seguia seu ritmo natural. Não me perco nas modernidades pois minha alma será sempre atemporal. O tempo que me cabe eu o vivo em cada cena de uma nova peça da qual sou protagonista. Não nasci para ser coadjuvante no plural de multidões. Faço-me ator de personagens que em mim ganham novas falas a cada encontro sempre novo.

Abraço as borboletas e danço com as nuvens. Meu céu é um pedaço de minhas alegrias e nele antecipo a chegada de minhas alegrias. Não perco a hora quando o que desejo é ser eu mesmo. Desamarro os nós de minhas inquietações e descanso meus pés já cansados na leveza de uma sombra graciosa. Escuto o longe dos meus silêncios e transfiguro minhas saudades no espaço do amor que não cabe em meu peito.

Do contrário que não entendo faço versos em tantos contextos. Minha cama tem a colcha costurada com os retalhos das cores que em cada dia deixam o seu tom de eternidade impresso nas varandas do meu ser. Da essência sou a vida e do amor outros tantos.

Pe Flávio Sobreiro
Escritor, Poeta, Estudante de Filosofia Clínica
Cambuí/MG

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