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A livraria no caminho entre o parque e o café*


"O tempo presente e o tempo passado
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo tempo é irredimível"
T.S.Eliot

No caminho entre o restaurante, café, a livraria do sebo, Ex Libris, e do meu trabalho paro quase sempre para olhar a vitrine. Abro a porta e falo com a moça que atende e pergunto: o que tem de interessante ou quanto custa esse aqui?

Já comprei muitos livros e o que mais impressiona são as dedicatórias, ou quando as pessoas resolvem sublinhar com lápis e canetas coloridas o mesmo livro. Foi hoje, três cores em um livro. Um senhor livro, um T.S. Eliot, Poesia (Collected Poems). Tradução de Ivan Junqueira, Nova Fronteira, 2 edição, 1981.

Livro que já tive, que ganhei um dia de aniversário nos anos 80. Perdi num bar quando estava viajando de férias. Sei lá. Li, reli os poemas depois na casa de uma namorada que me emprestara e tive o trabalho de devolver no final do romance. Nunca vendi um livro que amasse. Terminei os romances em minha vida.

A dedicatória é assim:
“Espero que “Poesia” seja mais um meio de fazer com que continues sempre inspirado. Não deixa morrer o poeta que mora em ti. Com carinho. Sylvia – 17/XII/81”

Isso aconteceu no século passado. Será que o poeta está morto? Cansou da poesia, talvez. Talvez tenha precisado vender para pegar uns trocados. O tempo passou e ninguém come livro nem se alimenta de poesia. Talvez. Quero dizer, não enche barriga. Será que a solidão tomou conta do poeta e ele para precisar comprar um remédio, uma bebida, teve que vender o T.S. Eliot? Eu não teria coragem de me desfazer de um livro como esse.

Sempre fico curioso quando entro nas livrarias de sebo e vou logo ver o que tem anotado em suas páginas amarelecidas. Eu mesmo já comprei um livro que era meu e tinha sido roubado anos antes. Isso quando ainda cursava Filosofia. Levaram o "Contra o Método", mas tempo depois trouxe de volta para casa com minha assinatura e tudo. Sem dedicatória, é claro, porque duvido muito que ganharia de alguém esse tipo de livro. 

Nele encontrei as páginas sublinhadas pelo gatuno intelectual. Sei quem foi. Um amigo que depois de ler viu que ser anarquista epistemológico era um perigo trabalhando no governo municipal idealista de esquerda de Porto Alegre e isso poderia ser um convite para cortar os pulsos de desilusão ideológica. Ele se desfez vendendo à livraria ou resolveu simplesmente trocar por algo mais voltado aos seus ideais. Sei lá. Não me interessa.

*Prof. Dr. Luis Antônio Paim Gomes
Filósofo. Jornalista. Editor. Professor. Livre Pensador.
Porto Alegre/RS

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