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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*


"Um poeta é o menos poético de tudo o que existe, porque lhe falta identidade; continuamente está indo para - e preenchendo - algum outro corpo. O sol, a lua, o mar, assim como homens e mulheres, que são criaturas de impulso, são poéticos e têm ao seu redor um atributo imutável; o poeta não, carece de identidade. Certamente é a menos poética das criaturas de Deus."

"(...) porque se, na verdade, é o homem esse animal que quer permanecer, o artista busca permanência transferindo-se para sua obra, fazendo-se sua própria obra, e atinge-a na medida em que se torna obra."

"Se o poeta é sempre 'algum outro', sua poesia tende a ser igualmente 'a partir de outra coisa', a encerrar visões multiformes da realidade na recriação singularíssima da palavra."

"Os poetas se compreendem de poema a poema melhor do que em seus encontros pessoais."

"Com Antonin Artaud calou na França uma palavra dilacerada que só esteve pela metade do lado dos vivos enquanto o resto, partindo de uma linguagem inalcançável, invocava e propunha uma realidade vislumbrada nas insônias de Rodez."

"Surrealismo é cosmovisão, não escola ou ismo: uma empresa de conquista da realidade, que é a realidade certa em vez da outra de papelão e para sempre ressequida. (...) e não a mera continuação, dialeticamente antitética, da velha ordem supostamente progressiva."

"Viver importa mais do que escrever a não ser que o escrever seja - como tão poucas vezes - um viver."

"'Se sou poeta ou ator, não o sou para escrever ou declamar poesias, mas para vivê-las', afirma Antonin Artaud numa de suas cartas a Henri Parisot, escrita do asilo de alienados de Rodez."

"O poeta não é um primitivo, mas sim, esse homem que reconhece e acata as formas primitivas: formas que, olhando-se bem, seria melhor chamar 'primordiais', anteriores à hegemonia racional, e logo subjacentes ao seu famigerado império."

*Julio Cortázar in "Valise de Cronópio". Ed. Perspectiva. SP. 2013.

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