Quando nasci, as manhãs tinham
tonalidades de esperança. Meu primeiro sorriso guardava a pureza das flores
mais belas. A liturgia do tempo sacramentalizava minha simplicidade.
Descobri-me ser humano antes mesmo de saber que eu viria a ser. Fui tecido com
tramas de amor e pontos de ternura. Construí-me na pluralidade das descobertas
e na singularidade dos meus gostos.
E foram tantos os desgostos, que de agosto
a agosto as estações foram cumprindo seu ritual de invernos e primaveras. Hoje encontro-me
em tempos que não me reconheço e em abraços que nunca recebi. Convivo com
saudades que ainda não sei nomear. Descubro-me feliz em meio a infelicidades.
Continuo sendo recortado por palavras
que no fio do silêncio sangram minhas memórias. A dor de tantos anos reaparece
em noites estreladas que ao longe reacendem as esperanças de um novo alvorecer.
Saudade define meu ser que nas tardes
sem perspectiva aos poucos repousa nos antônimos de meus medos. Tantos verbos sem ação. Tantos sujeitos sem
pronomes. Tantas mágoas sem lágrimas. Não foi fácil encontrar as pérolas que
diziam haver nas ostras. Fechadas não se
permitiram revelar a beleza do encanto.
E de desencanto comecei a regar jardins
e cultivar tulipas. Na matéria-prima do cuidado sementes germinaram em meio as
dores e feridas. A tristeza por vezes chegava no solo seco dos sertões da
decepção, porém afastava-as com o espantalho de outros pretéritos.
No composto da vida renasci dos mitos e
desbravei cavernas. Hoje recolho as belezas dos aprendizados que vez ou outra
nascem em meio as ervas daninhas que nascem à beira de tantos outros rincões
que povoam minha alma.
Recolho flores e folhas secas. Nos
canteiros de minha alma há sempre um espaço para o novo que o futuro do
presente sempre inaugura nas estações do meu ser.
*Pe.
Flávio Sobreiro
Teólogo. Filósofo. Escritor. Estudante de Filosofia Clínica.
Inconfidentes/MG
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