“Eis como meu gosto pessoal, ligado à finitude dos
prazeres materiais, adquire uma dimensão infinita, imaterial, espiritual.”
José Gil (A imagem-nua e as pequenas percepções)
Ainda existe o jamais
ouvido, o nunca lido, aquele que nunca foi trilhado pelos olhos? Há! O que vive
é o que já está prestes ao vivido. Depois é tudo passado. Pois, o que o corpo
quer é só mesmo mostrar ao Outro o que a ele não lhe pertence.
O desejo de pertencimento
deixa de ser o melhor, o que vive do outro lado do rio é que se quer. A meu
ver, só para ser manter no espaço do inaudito, o que quero primeiro é ter este
pertencimento. Por dentro, até o fundo de todas as cores, o que o olho alcança
não é limite para o sentir.
A letra tem sua
tradução. O purista que me perdoa, ele só quer ser inaudito para dificultar o
olhar do que possa deslegitimá-lo. Esse
é só um mais tradutor seco, não é um transcriador. Precisamos de quem possa ler
ao mundo toda a produção, que possa ir além de sua fronteira. Os nacionalismos
correm esse risco, de confinar novamente a criação, de eleger o melhor e depois
transformar em um produto inalcançável.
O seco, o tinteiro do
tempo permanece úmido da última poética. Imagem estonteante ao migrante que
descobre a língua distante. O que não é dele não tem dono. Entra pelo mundo com
sua dor, sua fuga, ele não quer saber de religião, não deseja um país tal qual
ele conhecia.
Quer poder sentir a
possibilidade de pensar em viver mais do que só o presente imóvel. Quer
acordar, planejar atravessar a rua até uma praça, ver gente sorrir, crianças
despojadas da moralidade imposta.
O desejo do migrante é
mais sagrado do que a leitura inaudita do leitor. Ele quer todos ao mesmo
tempo. Uma nova forma de criar pode ir aquém do tempo, como as mulheres
escravas da Idade Média que faziam sarja com a lã do senhorio, que engordavam a
vida dos donos, moeda de troca, do local que existia do outro lado da cidade.
Hoje, escravidão está
no inominável sentimento de posse para depois se deixar como enriquecimento,
tal qual a produção da lã, a criação é querer ser dono de uma cultura e render
bônus entre os pares. Existe o inaudito, mas na fuga, na tangente que a
linguagem se forma e destrói o que vem por todos os lados, na “communio
spiritus”, na trânsfuga das línguas o corpo em massa é um levante, a revolta
sem cátedra. Onde estão os leitores deste tempo?
*Prof. Dr. Luis Antonio
Paim Gomes
Filósofo. Editor. Livre
Pensador.
Porto Alegre/RS
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