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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*


"Um apetite de vida aumenta com o ardor das palavras. O poeta já não descreve - exalta. É preciso compreendê-lo seguindo o dinamismo de sua exaltação. Entra-se então no mundo admirando-o. O mundo é constituído pelo conjunto das nossas admirações"

"Os poetas, em seus devaneios cósmicos, falam do mundo na linguagem do mundo. As palavras, as belas palavras, as grandes palavras naturais, acreditam na imagem que as criou. Um sonhador de palavras reconhece numa palavra do homem aplicada a uma coisa do mundo uma espécie de etimologia onírica"  

"As palavras do mundo querem fazer frases. Sabe-o bem o sonhador que, de uma palavra que sonha, faz surgir uma avalancha de palavras"

"As cosmogonias antigas não organizam pensamentos, são audácias de devaneios, e para devolver-lhes a vida é necessário reaprender a sonhar"

"E que vem a ser um belo poema senão uma loucura retocada ? Um pouco de ordem poética imposta às imagens aberrantes ? A manutenção de uma inteligente sobriedade no emprego - ainda assim intenso - das drogas imaginárias. os devaneios, os loucos devaneios, conduzem a vida"

"O ser do sonhador invade aquilo que o toca, difuso no mundo. Graças às sombras, a região intermediária que separa o homem e o mundo é uma região plena de uma plenitude de densidade ligeira. Essa região intermediária amortece a dialética do ser e do não-ser"

"Que importam para nós, filósofo do sonho, os desmentidos do homem que reencontra, após o sonho, os objetos e os homens ? O devaneio foi um estado real, em que pesem as ilusões denunciadas depois. E estou certo de que fui eu o sonhador. Eu estava lá quando todas essas coisas lindas estavam presentes no meu devaneio. Essas ilusões foram belas, portanto benéficas. A expressão poética adquirida no devaneio aumenta a riqueza da língua"

*Gaston Bachelard in "A poética do devaneio". Ed. Martins Fontes. SP. 2001. 

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